segunda-feira, 20 de maio de 2013

Justiça Federal anula licenças ambientais do COMPERJ, mas depois volta atrás!

Obras do COMPERJ - Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro, da Petrobras, foram paralisadas, no dia 14 de Maio, por decisão da Justiça Federal que considerou nulas as licenças ambientais emitidas pelo INEA - Instituto Estadual do Ambiente. Porém, três dias depois, Petrobras conseguiu medida cautelar que suspende parcialmente a decisão.

As obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro estavam suspensas desde terça-feira, dia 14/05. O juiz federal substituto da 2ª Vara Federal de Itaboraí, Eduardo Ribeiro Filho, suspendeu as obras atendendo a uma Ação Civil Pública do Ministério Público Federal, de 2008, que apontava irregularidades na concessão das licenças ambientais para a construção do complexo, que tem como área de influência as unidades de conservação federais APA Guapimirim, ESEC Guanabara, APA Petrópolis e Parque nacional da Serra dos Órgãos.
O MPF alega que a autorização do INEA não é suficiente para avaliar os impactos causados na região. Na decisão, o juiz determinou que é preciso que o IBAMA atue diretamente no licenciamento da atividade, por motivos apresentados pelo MPF.

A Ação Civil Pública foi proposta pelo MPF em 2008 com pedido de antecipação de tutela que, entretanto, não foi concedido. Depois de cinco anos de tramitação, a Justiça Federal decidiu pelo acolhimento do pedido do MPF. Porém, medida cautelar suspendeu parcialmente os efeitos da sentença, autorizando a continuidade das obras na área interna do COMPERJ. Parece, porém, que as intervenções externas - como a construção do emissário submarino para despejo de esgotos nas praias de Maricá - foram excluídas da cautelar, pairando sobre elas os efeitos da sentença judicial original.

Estou buscando o teor da decisão cautelar, mas aproveito para disponibilizar o conteúdo da sentença que determinou a anulação das licenças ambientais. Aos envolvidos com a causa ou com o direito ambiental, vale a leitura.

0000503-53.2008.4.02.5107 Número antigo: 2008.51.07.000503-2
6001 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Autuado em 16/09/2008 - Consulta Realizada em 15/05/2013 às 12:38
AUTOR : MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
PROCURADOR: CRISTIANE PEREIRA DUQUE ESTRADA E OUTROS
REU : PETROLEO BRASILEIRO S/A- PETROBRÁS E OUTROS
ADVOGADO : PATRICIA ALMEIDA REIS E OUTROS
02ª Vara Federal de Itaboraí - EDUARDO DE ASSIS RIBEIRO FILHO
Juiz - Sentença: EDUARDO DE ASSIS RIBEIRO FILHO
Redistribuição em 13/04/2011 para 02ª Vara Federal de Itaboraí
Objetos: MEIO AMBIENTE: Dano Ambiental - Responsabilidade Objetiva – Administrativo

SENTENÇA
Tratam os autos de ação civil pública apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) em face de Petróleo Brasileiro S/A - Petrobras, Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente - FEEMA e Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, objetivando Anular atos administrativos realizados em processo de licenciamento ambiental do COMPERJ e estruturas associadas realizadas pelo INEA/FEEMA sem participação do IBAMA.
Alega em síntese na petição inicial: a) o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ) está sendo instalado a aproximadamente 05 km de unidade de conservação sob a fiscalização do IBAMA; b) apesar disso, o IBAMA não participou da análise do EIA/RIMA, ficando essa efetivamente ao encargo do INEA/FEEMA; c) técnicos do IBAMA fizeram manifestação técnica separada onde apontaram impactos ambientais decorrentes da implementação do COMPERJ, apesar disso a Superintendência do IBAMA no Rio de Janeiro emitiu autorização de licenciamento. Ao mesmo tempo a INEA/FEEMA opinou pela concessão da Licença Prévia, que foi emitida e curto espaço de tempo ; d) apenas dois dias após a concessão da Licença Prévia já foram apresentados
pareceres no sentido de conceder a Licença de Instalação; e) a Petrobrás registrou em Diagnóstico Ambiental que a Área de Influência Direta (AID) do COMPERJ possui raio de 20 km de seu centro de gravidade, o que afetaria as áreas de proteção ambiental de Petrópolis e de Guapimirim e Estação Ecológica da Guanabara. A Área Diretamente Afetada (ADA) possui raio de 10 km e atinge região de mangue; f) Houve inépcia na atuação do INEA/FEEMA, de forma que caberia ao IBAMA atuação supletiva; g) a PETROBRAS realizou fracionamento indevido do licenciamento ambiental, tendo sido analisado em separado, por exemplo a licença do sistema de dutos, sob a denominação de infra-estrutura externa associada; h) não houve a realização de Avaliação Ambiental Integrada (AAI) por parte do INEA/FEEMA, o que contraria a Lei Estadual nº 3.111/98.
Houve pedido de Antecipação dos Efeitos da Tutela que ficou para ser analisado, após a manifestação dos requeridos (fls. 61).
Notificada a se manifestar sobre o pedido de tutela antecipada, a Petrobrás alegou às fls. 73/80 que a competência para analise do EIA/RIMA é apenas do INEA/FEEMA, que existe no caso periculum in mora reverso e que a Justiça Federal é incompetente para analisar o caso.
O INEA/FEEMA, após ser regularmente notificada afirmou às fls. 93/13, que a áreas de proteção ambiental ficam a mais de 10 km do centro da área da COMPERJ, o que afasta qualquer alegação de ocorrência de impacto direto sobre as áreas de proteção ambiental. Alegou-se ainda que a competência para o licenciamento é apenas da FEEMA e que não houve fracionamento das licenças ambientais.
IBAMA, por sua vez alegou às fls. 254/273 que o ICMBIO é o atual responsável pelas áreas de proteção ambiental, sendo necessária sua manifestação em integrar o feito. Alegou ainda que estão ausentes os requisitos legais para a concessão da antecipação da tutela e requereu a realização de audiência de conciliação.
Às fls. 299/327, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido.
Às fls. 330/368, o MPF apresentou Agravo de Instrumento da decisão que indeferiu a antecipação de tutela.
Após ser regularmente citada, o INEA/FEEMA apresentou contestação às fls. 410/431, onde aduziu: a) é competente para a expedição das licenças ambientais no caso em tela; b) o critério que permite distinguir em qual nível federativo deve ser licenciado um determinado empreendimento é o da área de influência direta do impacto ambiental, pouco relevando a questão dominial relativa aos terrenos nela compreendidos; c) a Baia da Guanabara não compõe o mar territorial, mas constitui-se de águas interiores, nos termos da Lei nº 8617/93; d) no que diz respeito às áreas de proteção ambientais federais, a competência do IBAMA ocorre apenas nos casos em que os empreendimentos se localizem no interior desses áreas, o que não ocorre no presente caso; e) o EIA/RIMA que subsidiou a licença prévia analisou o projeto como um todo, valendo ressaltar que até mesmo se procurou antever cenário em que o COMPERJ figurará como polo de atração de empresas de transformação de resinas termoplásticas; f) o STF aceita que o EIA/RIMA pode ser finalizado antes da expedição da licença de instalação, mas após a expedição da licença prévia, se necessário, sem que se vislumbre em tal fato qualquer ideia de fracionamento do licenciamento; g) não houve violação à Lei Estadual nº 3.111/98, pois o estudo de sinergia foi elaborado no bojo do próprio estudo de impacto ambiental, seguindo a orientação traçada no item 4.2 da Instrução Técnica DECON 01/2007.
Devidamente citada, a PETROBRAS S/A apresentou contestação às fls. 437/459, alegando o seguinte: a) incompetência da Justiça Federal por não haver qualquer pedido em face do IBAMA;
b) a atribuição do EIA/RIMA é exclusiva do órgão estadual, tendo o IBAMA enfrentado a questão na seara administrativa por meio do Parecer nº 312/CONJUR/MMA/2004; c) a dominialidade do bem onde se encontram os recursos ambientais eventualmente afetados pelo empreendimento não tem relevância para a fixação do ente que tem a atribuição para conduzir o licenciamento ambiental;
d) o fato do EIA/RIMA descrever ecossistemas existentes na Área de Influência Direta (AID) e na Área Diretamente Afetada (ADA) não significa que os mesmos serão impactados pelo empreendimento; e) o impacto ambiental do empreendimento esta circunscrito ao Estado do Rio de Janeiro; f) consta no processo de licenciamento conduzido pelo INEA/FEEMA as autorizações dos gestores de unidades de conservação que se localizam na área de influência do empreendimento, incluídas aquelas sob administração federal; g) não há que se falar em inépcia do INEA/FEEMA; h) não houve fracionamento do EIA/RIMA; i) a rapidez com que foi conduzido o processo não importa em ilegalidade, tendo sido realizadas várias reuniões anteriores com os interessados.
O IBAMA apresentou contestação às fls. 486/490, afirmando em apertada síntese que: a) ilegitimidade passiva: b) no âmbito federal, foi realizada a análise do EIA/RIMA pelo IBAMA/RJ e ICMBio, conforme preceitua a norma da Resolução CONAMA nº 13/90, diante da necessidade de haver a manifestação dos responsáveis pela administração da Unidade de Conservação Federal  APA Guapimirim, tendo sido elaborado um estudo técnico manifestação técnica sobre os impactos ambientais potenciais decorrentes da implantação do COMPERJ nas unidades de conservação federais da região; c) juntou em anexo a Autorização nº 01/2008 - Ref. U.C. APA Guapirimirim e ESEC Guanabara.
O MPF apresentou réplica às contestações às fls. 581/586.
Às fls. 583 o INEA/FEEMA requereu a produção de prova pericial e documental. Já o IBAMA afirmou às fls. 590 que não tinha provas a produzir. A PETROBRAS se pronunciou pela produção de prova documental às fls. 594/595.
O MPF se pronunciou pelo deferimento da produção da prova documental às fls. 633/634.
Às fls. 641 foi deferida a produção de prova documental pelos réus, ficando postergada a análise do requerimento de prova pericial para após justificativas a serem apresentadas pelo INEA/FEEMA.
As provas documentais produzidas ao longo do tramite processual foram anexadas em autos apartados para facilitar o manejo dos autos.
O MPF apresentou alegações finais às fls. 726/746, a PETROBRAS às fls. 749/761, o INEA/FEEMA, às fls. 775/784 e o IBAMA às fls. 785/791.
Intimadas as partes a se manifestar sobre um possível acordo, o MPF se manifestou de forma contrária, tornando-se impossível, portanto, o concerto, apesar das manifestações positivas tanto da Procuradoria Federal quanto da Petrobrás S/A.
É o relato pertinente.

DECIDO.
Primeiramente não poderia deixar de registrar o entendimento desse magistrado no sentido que de o acordo entre as partes seria a melhor alternativa para o caso em questão uma vez que a presente sentença, independentemente de seu teor e conteúdo decisório, muito provavelmente será objeto de recurso pelas partes o que faz perpetuar o cenário de insegurança jurídica, seja do investimento que está sendo realizado, seja do bem ambiental. Insegurança essa que deixaria de existir com o acordo que poderia ser firmado ainda nessa primeira instância.
Dito isso, passo ao julgamento.
Inicio pela preliminar de incompetência da Justiça Federal para julgar o feito.
Tal alegação já foi enfrentada quando do indeferimento do requerimento de antecipação da tutela (fls. 306), tendo aquela decisão apresentada a seguinte fundamentação para o indeferimento dessa preliminar:
Cumpre, de início, assentar a competência da Justiça Federal para apreciar a matéria objeto desta ação, na forma do art. 109, I, da Constituição da República, eis que, além de figurar como ré Autarquia Federal, IBAMA, trata-se de demanda que visa à proteção também de bens da União, de acordo com art. 20, VI e VII da Carta Magna Adoto como razão de decidir a fundamentação e acrescento ainda que a alegação de que não há requerimentos em face do IBAMA como fundamento da incompetência e ilegitimidade passiva do IBAMA não merece prosperar uma vez que toda a ação gira em torno da necessidade ou não da atuação do IBAMA no licenciamento das obras do COMPERJ.
Superada a preliminar arguida e estando presentes os pressupostos processuais e condições da ação, passo à análise do mérito.
O meio ambiente recebeu especial importância da Constitucional Federal vigente, tendo o atual texto determinado que os entes federados possuem competência concorrente para legislarem sobre o tema (art. 24, VI, VII e VIII), bem como competência comum em sua atuação (art. 23, VI e VII).
Ao se tratar a proteção ao meio ambiente como competência comum a Constituição acaba por adotar de forma implícita o princípio da subsidiariedade na atuação dos entes federados, princípio esse que acabou ser explicitado tanto pela Lei nº 6938/81, quanto pela Resolução CONAMA 237/97 e Lei Complementar nº 140/2011, que atualmente regem o licenciamento ambiental.
Acerca do princípio da subsidiariedade, ele tem início com Enciclica Papal Quadragésimo anno, de 1931 merecendo destaque aqui a afirmação do PAPA PIO XI de que seria cometer injustiça, ao mesmo tempo que torperdear de maneira bem criticável a ordem social, retirar de grupamento de ordem inferior funções que ela poderia normalmente exercer de forma eficaz e conferi-las a um grupamento mais vasto e elevado.
Tal pensamento foi transplantado para a política e para o Direito, servindo como justificativa para a adoção de administrações descentralizadas, bem como para atuação suplementar e complementar de um ente federado ou de um órgão administrativo em relação a outro. Acerca desse princípio merece destaque a seguinte passagem do Constitucionalista mineiro José Alfredo de Oliveira Baracho em sua obra: O princípio da subsidiariedade - conceito e evolução:
“...O princípio da subsidiariedade explica e justifica, em muitas ocasiões, a política de descentralização. A compreensão do princípio de subsidiariedade, em certo sentido, procura saber como em organização complexa pode-se dispor de competências e poderes. Aceitá-lo é, para os governantes, admitir a idéia pela qual as autoridades locais devem dispor de certos poderes. O princípio da subsidiariedade intui certa idéia de Estado, sendo instrumento de liberdade, ao mesmo tempo que não propõe a absorção de todos os poderes da autoridade central. (fls. 30)
Uma vez identificado o princípio que está a embasar toda a discussão travada nesses autos, faz-se necessário identificar a legislação ambiental que rege o licenciamento, bem como aclarar seus limites.
A CF/88 em seu artigo 225 dispôs que todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impôs ao Poder Público e à coletividade o dever de protege-lo e preserva-lo, tendo para tanto, em seu inciso IV, exigido que ¿para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que dará publicidade”.
Ao regular a passagem constitucional mencionada, o art. 10 da Lei nº 6938/81, assim dispôs:
Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis. (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989)
Ressalta-se aqui que, apesar da Lei Complementar nº 140/2011, ter alterado a redação desse artigo, não foi suprimida a incidência do princípio da subsidiariedade no direito ambiental pátrio, tendo sido mantido o caráter supletivo da atuação da União, conforme se nota no art 2º e 7ª, XIII e XIV abaixo transcritos:
Art. 2o Para os fins desta Lei Complementar, consideram-se:
I - licenciamento ambiental: o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental;
II - atuação supletiva: ação do ente da Federação que se substitui ao ente federativo originariamente detentor das atribuições, nas hipóteses definidas nesta Lei Complementar;
III - atuação subsidiária: ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições decorrentes das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo originariamente detentor das atribuições definidas nesta Lei Complementar.
Art. 7o São ações administrativas da União:
XIII - exercer o controle e fiscalizar as atividades e empreendimentos cuja atribuição para licenciar ou autorizar, ambientalmente, for cometida à União;
XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades:
a) localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe;
b) localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva;
c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas;
d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs);
e) localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais Estados;
Assim, não há que se falar em revogação da Resolução nº 237/97 devido a vigência da Lei Complementar nº 140/2011. Acresce-se ainda que o artigo 8º, XIII, delegou à Resolução CONAMA a atribuição de definir as situações em que cabe ao Estado o licenciamento ambiental ao afirmar que cabe a esse ente ¿promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, ressalvado o disposto nos arts. 7o e 9º - que versam sobre a competência da União e do Município.
A resolução CONAMA 237/97, concretiza as disposições constitucionais e legais em seu art. 5º, assim dispondo sobre a atribuição dos Estados para o licenciamento ambiental:
Art. 5º - Compete ao órgão ambiental estadual ou do Distrito Federal o licenciamento ambiental dos empreendimentos e atividades:
I - localizados ou desenvolvidos em mais de um Município ou em unidades de conservação de domínio estadual ou do Distrito Federal;
II - localizados ou desenvolvidos nas florestas e demais formas de vegetação natural de preservação permanente relacionadas no artigo 2º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, e em todas as que assim forem consideradas por normas federais, estaduais ou municipais;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais de um ou mais Municípios;
IV - delegados pela União aos Estados ou ao Distrito Federal, por instrumento legal ou convênio.
Ante o acima esposado e com base ainda no princípio da subsidiariedade tem-se que para fins de atribuição para o licenciamento ambiental, a regra é observar apenas a extensão do impacto ambiental, ignorando-se o local do empreendimento. A exceção está no art. 4, I da Resolução Conama 237, que será oportunamente tratada.
Fixada a premissa principiológica e legal, passamos à análise dos elementos e alegações presentes nos autos.
Ressalto desde já que o acordo de cooperação técnica nº 12/2008 juntado às fls. 492/495 e utilizado para embasar a alegação do IBAMA de ilegitimidade passiva e legitimidade do INEA/FEEMA para atuar não é instrumento de delegação de competência, mas simples ato de cooperação técnica entre o órgão federal e o estadual, de forma que não afeta a análise que aqui será realizada.
O COMPERJ é um complexo industrial de iniciativa da Petrobrás para refino de petróleo e produção de petroquímicos. Esse empreendimento está localizado no Município de Itaboraí, porém seus dutos tanto para o recebimento de petróleo, como de gás e efluentes líquidos acabam também por afetar outros municípios, como São Gonçalo e Maricá.
Para que esse empreendimento opere, faz-se necessário não somente a construção do que é chamado de Unidade Básica de Produção (UPB) que tem como missão o refino de petróleo e a produção de subprodutos dele derivado, mas também a construção de estradas para passagem de veículos pesados, a construção de píer para o transporte de grandes equipamentos, a instalação de
linhas de transmissão com capacidade superior a 354kV, construção de hidrovia com porto na região de São Gonçalo, construção de estação de tratamento de esgoto e dutos de captação de água e de eliminação de efluentes resultantes da produção.
Desta forma, para uma correta análise ambiental do empreendimento, e para se definir a atribuição para a análise do EIA/RIMA elaborado, bem como para a concessão ou denegação de licenças ambientais, faz-se necessário considerar todos os elementos acima frente a legislação pátria.
Segundo afirma o MPF, o empreendimento chamado COMPERJ atinge direta ou indiretamente as seguintes áreas de proteção ambiental federais: Área de Proteção Ambiental de Petrópolis, Área de Proteção Ambiental de Guapimirim e Estação Ecológica da Guanabara, além de bens da União Federal, como o ecossistema manguezal, a Baia da Guanabara e o Mar Territorial.
Apesar de não termos lide em relação ao caráter federal das áreas de proteção acima mencionada, há discussão nos autos sobre a classificação jurídica da Baia de Guanabara, o que afeta diretamente o cerne dessa ação, uma vez que se for considerada como agua interna a atribuição para licença sobre atividades que a afetam é do Órgão Estadual, caso seja considerada como mar territorial, a competência é do Órgão Federal, conforme art. 4,I, da Resolução Conama supra citada.
Desta forma, passo a analisar a classificação jurídica das águas da Baia da Guanabara.
No âmbito internacional os espaços marítimos são regulados pela Convenção de Monte Bay de 1982 (Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar). Essa convenção em seu artigo 8º afirma que “as águas situadas no interior da linha de base do mar territorial fazem parte das águas interiores do Estado”.
Essa classificação foi mantida pelo Brasil ao se promulgar a Lei nº 8.617/93 quando em seu artigo 1º se definiu que quanto à demarcação da linha inicial do mar territorial na faixa litorânea que possui recortes profundos, será aplicado o método da linha de base reta.
A baia da Guanabara é um recorte profundo na linha costeira nacional, estando as águas a ela pertencentes dentro da área continental não podendo, dessa forma, ser considerada, sob o aspecto jurídico como mar territorial.
Melhor esclarecendo o significado de águas interiores merece destaque a lição de Valério de Oliveira Mazzuoli:
Como se percebe, as águas interiores às quais se refere a Convenção, são águas que fazem parte do mar aberto, não sendo ¿interiores¿ propriamente ditas. Trata-se apenas de uma ficção jurídica, uma vez que não chegam a penetrar no território do Estado. Tais águas estão localizadas entre a costa e a
linha de base do mar territorial do Estado e constituem parte integrante do território nacional (são águas nacionais, em que o Estado exerce ilimitadamente sua soberania, mas não propriamente interiores). (Curso de Direito Internacional Público, 4ª ed. Editora RT, p. 705).
Isso fica muito claro quando olhamos a seguinte imagem da Baia da Guanabara e arredores abaixo reproduzida:
Assim, juridicamente não há como se considerar a Baia de Guanabara como mar territorial, sendo aqui tratada como água interior, o que faz com que o empreendimentos realizados exclusivamente em sua área devam ser objeto de licenciamento pelo órgão ambiental estadual e não federal.
Porém, como será à frente demonstrado, o COMPERJ não afeta apenas as águas da Baia da Guanabara, bem como não se limita à área terrestre no entorno da baia.
Ainda sobre o tema, a Petrobras defende a atribuição da FEEMA/INEA sob a alegação de que o impacto é apenas local e que deve ser aplicado o entendimento esposado no Parecer nº 312/CONJUR/MMA/2004, juntado às fls. 463/484 dos autos principais.
O mencionado parecer afirma que para fins de delimitação de atribuição para o licenciamento ambiental deve-se observar apenas a extensão do impacto ambiental, sendo irrelevante o local onde é desenvolvido o empreendimento, uma vez que os bens ambientais não pertencem aos entes federativos, mas são bens comuns de todos.
Ocorre que esse Parecer ignora por completo o art. 4º da Resolução Conama nº 237/97, situação lá prevista que ainda vige após a LC nº 140/2011, ou seja, apesar de a regra ser considerar que apenas o impacto ambiental para fins de determinação de atribuição, há localidades especiais em que o legislador e o administrador entenderam que o Órgão Federal teria melhores condições de atuação, dentre eles os casos em que o empreendimento localiza-se ou desenvolve-se ao longo do mar territorial.
O entendimento que é aqui adotado parte da interpretação de que os incisos do art. 4 da Resolução Conama nº 237/97, que foi transcrito quase que integralmente para o art. 7º, XIV, da LC nº 140/2011, são exceções à regra que é prevista em tal perecer e atraem a competência do IBAMA mesmo quando seu impacto não transcende a área geográfica do Estado da Federação. Essa
interpretação afasta tanto o cometimento de atribuições excessivas ao IBAMA, quanto garante as prerrogativas mínimas da autarquia.
Deixe-se claro ainda que o simples fato de um empreendimento localizado ou desenvolvido integralmente fora do mar territorial, afetar direta ou indiretamente o mar territorial não é suficiente para atrair a competência da Autarquia Federal. A exceção é aplicável apenas quando o empreendimento se localiza ou desenvolve-se nas localidades previstas no art. 7º, XIV, da LC 140/2011.
Passo à análise da argumentação de que a COMPERJ impactará direta e indiretamente sobre as áreas de proteção federal e estações ecológicas acima mencionadas.
Nesse ponto a legislação pátria, em especial a Lei n 9.985/2000, é clara ao afirmar que apenas quando o empreendimento ocorrer dentro da área de proteção ambiental federal é que o licenciamento fica a cargo do órgão ambiental federal, atualmente o ICMBIO.
Nos casos em que o empreendimento ocorre fora da área de proteção, porém direta ou indiretamente o afeta, faz-se necessário apenas aprovação do empreendimento pelos administradores das áreas de reserva ambiental, conforme se denota da leitura da redação do art. 36,§3º da Lei nº 9.985/2000.
Logo, como o empreendimento da COMPERJ não está a ocorrer dentro de área de proteção federal ou estação ecológica federal, faz-se necessário apenas a autorização da administração de tais áreas, sendo ainda de competência do Órgão Estadual o licenciamento.
No que diz respeito ao ecossistema de manguezal, tem-se as seguintes considerações:
O manguezal aqui tratado encontra-se dentro da Baia da Guanabara e não em área de Zona Costeira.
A Lei nº 11.428/2006 (dispõe sobre a proteção da Mata Atlântica) em seu artigo 2º, define o manguezal como ecossistema integrante do Bioma Mata Atlântica, conforme se nota na redação a seguir transcrita:
Art. 2o Para os efeitos desta Lei, consideram-se integrantes do Bioma Mata Atlântica as seguintes formações florestais nativas e ecossistemas associados, com as respectivas delimitações estabelecidas em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, conforme regulamento: Floresta Ombrófila Densa; Floresta Ombrófila Mista, também denominada de Mata de Araucárias; Floresta Ombrófila Aberta; Floresta Estacional Semidecidual; e Floresta Estacional Decidual, bem como os manguezais, as vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste. (Regulamento)
Na transcrição da audiência pública realizada pela PETROBRAS para se discutir o Projeto do COMPERJ fica claro que uma parte de manguezal sadio será atingida pelas obras, apesar de em escala menor que previsto originalmente, conforme se denota nas seguintes passagens abaixo transcritas:
A Petrobras então está aprimorando o projeto para utilizar a estrada existente, e somente nessa área onde vai construir a nova ponte, onde forem formados os pilares dessa ponte é que vai afetar um pedaço de mangue. Então, a área de mangue que está no EIA-RIMA, de 1,2 hec. vai ser diminuída significativamente.
Na área de manguezais encontramos uma ave chamada Figuinha-do-mange, que é indicadora de ambientes bem preservados. (fls. 17/18 do processo de licença prévia do empreendimento realizado pelo INEA/FEEM e presente nos autos anexos 06)
Porém o simples fato de estar mencionado no art. 225, §4º da CF/88 não atrai a competência do IBAMA. Ademais, o impacto ambiental sobre esse ecossistema, por si só, não afeta área além da Baia da Guanabara e do Estado do Rio de Janeiro.
Logo, o fato de afetar área de manguezal, por si só, não atrai a atribuição do IBAMA para o licenciamento ambiental.
Realizada a análise sobre questões pontuais levantadas nos autos, faz-se necessário verificar nesse momento o empreendimento do COMPERJ como um todo para fins de verificar se ainda subsiste alguma hipótese que atraia a atribuição do órgão federal para o licenciamento, bem como verificar se houve ou não indevido fracionamento de licenças.
Conforme já dito, o COMPERJ é um complexo industrial de iniciativa da Petrobrás para refino de petróleo e produção de petroquímicos. Esse empreendimento tem sua Unidade Básica de Produção localizada no Município de Itaboraí, porém seus dutos tanto para o recebimento de petróleo, como de gás e efluentes líquidos acabam também por afetar outros municípios, como São Gonçalo e Maricá.
Chama especial atenção a questão dos dutos e os impactos ambientais que podem causar, uma vez que sua extensão é superior a 40 km.
No volume 3 dos autos anexos consta cópia do processo administrativo nº 2038855/08 (INEA/FEEMA). Especificamente no campo “descrição das atividades” do Requerimento de obtenção de licença prévia de emissário, onde consta a seguinte informação:
O emissário para escoamento do efluente líquido tratado do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro - COMPERJ _ situado no município de Itaboraí. O presente emissário considera o lançamento oceânico do efluente líquido tratado em Maricá, cujo traçado pode ser visualizado no Desenho DE-4150.00-6500-940-PEN-007.
O trecho terrestre do emissário tem extensão de 41 km e será instalado em nova faixa de domínio, com largura de 20m. Esta faixa tem espaço suficiente para colocação de linhas destinadas ao esgotamento sanitário das populações residentes ao longo do traçado. Para o trecho submarino estima-se que a extensão esteja entre 3 a 5 km.
Vê-se, portanto, que o Complexo do COMPERJ não limita sua área de desenvolvimento à Baia de Guanabara ou às áreas de preservação lá localizadas, ocorrendo o envio de efluente em mar territorial na região de Maricá/RJ, próximo a praia de Itaipuaçu, conforme se nota no desenho e fotos constantes no Volume I do EIA/RIMA para a Implantação do Emissário submarino do COMPERJ (vide fls. 315 e estudo presente às fls. 255 até às fls. 332).
O que se tem é que o Sistema de Dutos do COMPERJ avança no mar territorial em mais de 3 Km, não podendo ser considerado tal meio ambiente apenas como mera área de influência do empreendimento, mas sim que o empreendimento, ou ao menos parcela dele, desenvolve-se para
dentro do mar territorial, o que afeta diretamente a atribuição para o licenciamento da atividade.
Conforme consta no art. 4º, I da Resolução CONAMA 237/1997, compete ao IBAMA o licenciamento ambiental quanto as atividades forem localizadas ou desenvolvidas no mar territorial.
Tal entendimento foi mantido pela Lei Complementar nº 140/2011, conforme se nota no art. 7º, XIV, “b”, anteriormente transcrito.
Acrescente-se que não há nos autos qualquer instrumento que comprove delegação de atribuição do IBAMA para a FEEMA/INEA no licenciamento de empreendimentos que desenvolvem-se ou se localizam no mar territorial.
Logo, tendo em vista que a licença ambiental deve ser concedida apenas por um órgão ambiental, que não é possível o fracionamento das licenças ambientais e considerando que o COMPERJ avança mais de 3 km sobre o mar territorial, a competência para licenciamento de todo o projeto deve ser do IBAMA e não do INEA/FEEMA.
Como consequência, julgo procedente o pedido nesse ponto.
Passo à análise da argumentação de ocorrência de fracionamento das licenças ambientais, bem como da ausência de análise da sinergia do COMPERJ com demais empreendimentos do local, conforme exigência da Lei Estadual do Rio de Janeiro nº 3.111/1998
Primeiramente, transcrevo o conteúdo da Lei nº 3.111/98 do Estado do Rio de Janeiro:
Art. 1º - Quando houver mais de um EIA/RIMA para a mesma bacia hidrográfica, a Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente deverá realizar a análise conjunta dos empreendimentos, para definir a capacidade de suporte do ecossistema, a diluição dos poluentes e os riscos civis, sem prejuízo das análises individuais dos empreendimentos.
Art. 2º - O não atendimento ao previsto nesta Lei anulará o licenciamento ambiental.
Nesse ponto da sentença, devemos nos ater primeiramente na forma como foram realizados os EIAs/RIMAs, bem como se foi ou não considerado o impacto ambiental da atuação sinérgica de cada elemento do Complexo da COMPERJ. Naturalmente, a questão das licenças e seu fracionamento ou não decorrerão dessa análise.
Foram juntados pelo MPF 12 caixas, com, em média, 08 volumes de processos em cada caixa versando sobre o licenciamento ambiental do Complexo do COMPERJ.
No manuseio de tais documentos nota-se que foram realizados diversos EIA/RIMAS e Licenças em separado os quais destaco os seguintes:
Documentos referentes à Licença de Instalação da Unidade Petroquímica Básica, presente nas caixas 02 e 03 EIA/RIMA do Emissário Terrestre Submarino, caixas 09 e 10 EIA/RIMA do Sistema Duto Viário - Caixa 11; EIA/RIMA das linhas de transmissão acima da 345 kV - Caixa 11; EIA/RIMA das vias de acesso de transportes de Grandes Equipamentos - UHOS - caixa 11.
Conforme se nota, foram realizados estudos diversos sobre cada unidade que compreende o Complexo do Comperj. Verifica-se ainda que apesar da grandiosidade do Estudo Realizado, não há considerações sobre o impacto ambiental que tais módulos do Comperj irão causar, em seu conjunto, ao meio ambiente, apesar de haver ampla análise no que diz respeito a cada elemento em separado.
Verifica-se ainda que o Relatório do Programa de Gestão Ambiental, decorrente da criação pela PETROBRAS do Programa de Gestão Ambiental não substitui a necessidade da análise do impacto ambiental oriundo da sinergia das estruturas, sendo tal Relatório simples acompanhamento do cumprimento das condicionantes ambientais impostas pelo INEA/FEEMA.
Apesar de não haver tais considerações no EIA/RIMA elaborado pela Petrobras, chama a atenção o conteúdo do Parecer Técnico nº 1.645/2008 elaborado pela FEEMA e presente às fls. 127/257 dos autos principais, onde se destacam os seguintes trechos que dizem respeito à análise da sinergia do empreendimento:
fl. 149: A Instrução Técnica emitida pela FEEMA para elaboração do EIA especificou que os estudos para avaliar o impacto do projeto na qualidade do ar na região, deveriam considerar desde as emissões geradas apenas pelo Complexo, até aquelas provenientes, também, do crescimento urbano polarizado pelas atividades do empreendimento num horizonte de 10 (dez) anos.
Fl. 150. Por meio dos estudos apresentados ficou claro que haverá um comprometimento da qualidade do ar na região com a implantação do Complexo, principalmente, no que se refere às emissões de óxidos de nitrogênio e hidrocarbonetos. Esses poluentes são os precursores do ozônio, que é formado na atmosfera pela reação fotoquímica entre os dois gases, sendo, portanto, seus níveis de concentração decisivos para sua formação.
O COMPERJ estará localizado em região, que possui grande número de unidades de conservação instituídas em leis federais,estaduais e municipais e o poluente ozônio destaca-se por seus efeitos danosos à vegetação. Nesses locais devem ser observados padrões secundários de qualidade do ar.
(...)
...Dessa forma, entendemos que o licenciamento ambiental, nessa situação, deva ser realizado de forma abrangente, considerando o conjunto de todos esses aspectos, por meio de instrumentos de gestão mais eficazes e modernos, com realização de estudos com maior profundidade e permanentemente atualizados com uma base de informações mais precisa, considerando o conjunto de dados primários que vêm sendo, continuamente gerados na região do COMPERJ Ocorre que num documento de mais de 100 páginas e que é referência para a liberação das Licenças ambientais, apenas as 02 páginas cujos trechos foram acima transcritos fazem referência à sinergia
ambiental do COMPERJ com estruturas já existentes na região das bacias hidrográficas afetadas.
Soma-se ainda o fato de não haver referência sobre o impacto sinérgico envolvendo apenas elementos que compõem todo o Complexo do COMPERJ
Conforme se nota, a analise se limita ainda ao aspecto da poluição atmosférica e poluição sonora, não havendo, por exemplo, análise sobre o impacto do lançamento dos efluentes na região de Maricá, sendo que nesse ponto o relatório se limitou a afirmar que esse lançamento não possui impacto ambiental, não explicando as razões disso e ignorando toda a preocupação externada pelas associações de pescadores da região registrada em audiência pública realizada pelo MPF em conjunto com o MPE/RJ e que está com as transcrições acostadas às fls. 767/771 dos autos onde destaco as seguintes passagens:
Flávia Coelho, representante da Associação de Preservação Ambiental das Lagunas de Maricá, considera que o licenciamento do emissário submarino da Comperj é irregular e a compensação ambiental para o despejo de efluentes é insuficiente. 2) Andressa Caldas, da Plataforma DHESCA Brasil, critica a postura de recusa da Petrobras em dialogar com os pescadores artesanais ...7)Roberto Ferraz, da Federação das Associações de Pescadores Artesanais do Rio de Janeiro, destaca a ineficiência do EIA/RIMA do emissário submarino de Maricá.
Soma-se à preocupação da população da região de Maricá o conteúdo da Manifestação Técnica do IBAMA juntada às fls. 501/516 pela Procuradoria Federal, onde se destaca o seguinte trecho sobre as características dos efluentes do COMPERJ:
Fls. 507: Para estimar as características dos efluentes do COMPERJ, foi adotada como referência a Refinaria do Paraná (REPAR), e não a Refinaria de Duque de Caxias (REDUC). Deveriam ser incluídas, também, as substâncias poluentes que serão empregadas nos processos petroquímicos, visto que o COMPERJ terá esta atividade, além de refinar. Deve ser esclarecido se este petróleo pesado de Marlim não terá maior potencial de impacto ambiental, com compostos mais complexos e persistentes, por demandar maior tratamento e por ser um processo pioneiro de refino, com a possibilidade de haver subprodutos e resíduos com riscos potenciais não previstos nos efluentes descartados. É louvável o objetivo de atingir 5 ppm, que é compatível com o background medido, no entanto, outros parâmetros podem ser bastantes significativos para serem controlados, devido sua toxidade.
Entre as substâncias que devem ser melhor analisadas, destacamos como exemplo os nocivos Hidrocarbonetos Poli-Aromáticos (HPAs) e os compostos benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno (BTEX). Embora não sejam citados na Resolução CONAMA 357/2005 limites para estas substâncias nos efluentes, eles constam como parâmetros para classificação dos corpos hídricos, que fatalmente, serão alterados com o incremento da carga poluente, restringindo suas possibilidades de uso (...).
É previsto um emissário submarino para a destinação final de efluentes, sendo apresentada uma alternativa de ponto de descarte na boca da Baia de Guanabara, que deve ser refutada, pois permite refluxo da pluma de contaminantes em caso de maré enchente, e a outra opção fica próxima à praia
de Itaipuaçu, cuja possibilidade de afetar praias e ilhas próximas é de grande relevância e de ser avaliada para todos os cenários de condições ambientais possíveis.
Ainda que todos os efluentes da área pertencente ao COMPERJ fossem lançados fora da Baia de Guanabara, o aumento da carga poluidora advinda de outras indústrias e do crescimento urbano proporcionado será bastante nocivo para os corpos hídricos da região. No EIA é apresentada estimativa de crescimento e atratividade industrial, porém deve ser exigido do empreendedor
também uma estimativa do aumento de poluição, que está diretamente relacionado.
Apesar de toda a preocupação acima demonstrada pelo IBAMA, não foi imposto pelo INEA/FEEMA qualquer condicionante que diz respeito à região de Maricá, sendo versado no item 8.3 (fls. 254 dos autos principais) condicionantes que dizem respeito apenas à Baia de Guanabara e rios afetados pela COMPERJ.
A explicação para a não menção a qualquer tipo de condicionante para a região de Maricá está no fato de que a análise da FEEMA/INEA trabalhou apenas com a hipótese dos lançamentos dos efluentes ocorrerem na Baia da Guanabara, não havendo qualquer analise sobre o impacto ambiental na região do Mar Territorial em Maricá, mas apenas sugestão de se adotar essa alternativa.
Vê-se isso claramente no item 21 (fls. 255 dos autos principais) que o INEA/FEEMA solicitou que fosse considerada no licenciamento do emissário submarino a alternativa de liberação dos efluentes em Maricá, pois a Baia da Guanabara está com o ambiente eutrofizado e o EIA/RIMA foi feito sem considerar os efeitos durante a maré baixa, conforme expressamente consta no Parecer técnico da FEEMA aqui mencionado.
Logo, o que se tem é que o Estudo realizado pela INEA/FEEMA consubstanciado no Parecer Técnico acima considerou um quadro que não mais existia quando do momento da liberação das licenças ambientais, uma vez que a alternativa de liberação dos efluentes na Baia da Guanabara, que foi a efetivamente analisada, foi substituída pela alternativa Mar Territorial na Região de Maricá (via praia de Itaipuaçu).
Assim, o que se tem é a real inexistência de estudo de impacto ambiental sinérgico tanto entre as estruturas que compõem o COMPERJ tanto quanto entre o COMPERJ e as estruturas já existentes.
Não se ignora que em empreendimentos de significativo tamanho, como por exemplo, o COMPERJ, é natural que o EIA/RIMA seja realizado para cada área em separado para fins de facilitação do Estudo. Porém, isso não permite aceitar que posteriormente a confecção dos estudos, não seja realizada análise sobre o impacto ambiental global do empreendimento em sua área de abrangência.
Deve-se ter em mente que as licenças ambientais podem ser formalmente separadas uma vez que cada item que forma o complexo do COMPERJ, por razões de engenharia e econômicas podem ser construídos e entrar em operação em momentos diferentes, porém, ideologicamente as licenças devem ser unas, ou seja, amparadas em EIA/RIMA que considerou o complexo do empreendimento como um todo e não apenas em sua parte.
No caso em tela os EIAs/RIMAS estão formalmente e ideologicamente separados por área dos empreedimento (EIA/RIMA do UBP, das Atividades Extra-Muros, das linhas de transmissão, dos dutos submarinos e etc) e o Parecer Tecnico da FEEMA/INEA (Parecer nº 1.645/2008) considerou apenas os efeitos ambientais da Unidade Básica de Produção (UBP), sendo sucinto, quando não omisso, em relação aos demais elementos do COMPERJ, o que afeta diretamente as licenças ambientais calcadas no Parecer.
Desta forma, é imperioso reconhecer a inexistência de fracionamento das licenças ambientais e ausência de análise do impacto ambiental sinérgico das estruturas do COMPERJ, o que viola tanto a Resolução CONAMA nº 237/97, quando a Lei Estadual do Rio de Janeiro nº 3.111/1998.
Assim, julgo procedente a ação também nessa parte.
Analiso a alegação de existência de INEPCIA DO INEP/FEEMA NA CONDUÇÃO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL.
O MPF em sua petição inicial aduz existir inépcia na atuação do INEA/FEEMA, de forma que justificaria a atuação supletiva do IBAMA no licenciamento ambiental do Complexo do COMPERJ.
Apesar da falha mencionada no item anterior, não há que se considerar que houve inépcia por parte do INEA/FEEMA.
Isso porque houve efetivo Parecer da FEEMA analisando os Estudos Ambientais apresentados pela Petrobrás, bem como um longo rol de condicionantes para a liberação da Licença de Instalação, apesar de nem todas terem sido cumpridas até o momento.
Acrescenta-se que a celeridade na atuação do INEA/FEEMA também não cria a presunção de atuação contra a lei ou contra a ética da administração pública.
É plausível e verossímil a alegação da Petrobrás de que a velocidade com que foram concedidas as licenças requeridas advém das prévias tratativas que estavam sendo realizadas entre o INEA/FEEMA e a empresa. Isso fica claro no conteúdo da caixa de documentos nº 01 apresentada pelo Ministério Público.
A simples troca de informações entre a empresa e o órgão ambiental com a finalidade de se antecipar eventuais exigências e com isso obter o licenciamento de forma mais célere, no entender desse juízo não configura violação aos princípios que regem a atuação de administração pública e nem, por si só, induz à presunção de irregularidade ou infração à ética ou a legislação.
Ademais, o MPF não trouxe qualquer elemento que poderia, de forma concreta, demonstrar a existência de conluio entre as partes que viole a ética ou a legislação e justificasse o afastamento do órgão ambiental sob essa alegação.
Logo, há que se julgar improcedente a ação no que diz respeito a essa fundamentação.
Por fim, faço as considerações finais sobre o atual estágio da implantação do Complexo do COMPERJ para fins de orientação e esclarecimento sobre o conteúdo da parte dispositiva da sentença que virá a seguir:
Como bem colocado pelas partes em suas alegações finais, o COMPERJ está em fase de implantação, ou seja, a fase referente à licença prévia já se encontra esgotada, ao menos em relação à UPB, e está o complexo na fase de construção.
Tal fato não pode ser ignorado por esse magistrado. Além disso, o princípio do desenvolvimento sustentável praticamente impede a anulação da licença prévia, pois ao mesmo tempo em que causaria considerável prejuízo econômico não traria ganhos efetivos ao meio ambiente que por ventura já tenha sido degradado. Ademais, eventual degradação desarrazoada ocorrida pode ser neutralizada ao se colocar a reparação ambiental do dano como condicionante para liberação das licenças de instalação e de operação.
Quanto a licença de instalação, atual fase de grande parte do complexo, entendo como razoável sua anulação frente a fundamentação supra, determinando que as partes IBAMA e Petrobras de imediato iniciem o procedimento para a obtenção de nova licença prévia, vigorando as condicionantes impostas pela FEEMA/INEA até que o IBAMA conceda nova licença e imponha suas próprias condicionantes.
Desta forma, o princípio da unicidade de licenças deverá ceder frente ao princípio do desenvolvimento sustentável, devendo ser mantida apenas as licenças conferidas pelo INEA/FEEMA que já se encontram exauridas, como por exemplo as licenças prévias de empreendimentos que já estão em fase de instalação ou operação, anuladas aquelas que ainda estão em desenvolvimento, como por exemplo, licenças de instalação de empreendimentos que ainda estão sendo instalados, cabendo ao IBAMA a concessão de licenças em substituição às que foram anuladas e as que ainda não foram objeto de requerimento.
Tal alternativa visa garantir a competência do IBAMA para atuar ao mesmo tempo em que evita que exista um lapso ambiental entre a anulação da licença conferida pela FEEMA/INEA e a conclusão dos trabalhos pelo IBAMA. Ademais, caso o órgão ambiental trabalhe com a celeridade que se espera os prejuízos econômicos advindos da paralisação pela falta de licença serão compensados com a segurança jurídica do empreendimento, ao menos em relação ao licenciamento ambiental, e a devida proteção ambiental.
Ressalto que em relação aos demais elementos do Complexo do COMPERJ que até o momento foi concedida apenas a licença prévia, a anulação atingira essa licença, uma vez que ainda não exaurida sua finalidade.
Além disso, deve-se considerar que a presente sentença abrange além do licenciamento da Unidade Petroquimica Basica (UPB), o licenciamento do Emissário Terrestre Submarino, do Sistema de Duto Viário, das Linhas de Transmissão acima de 345Kv, das vias de acesso terrestre e aquaviária de transporte de grandes equipamentos, incluindo o Pier que está em estudo, bem como do sistema de efluentes do COMPERJ, uma vez que o empreendimento deve ser considerada em seu todo e não de forma separada.

DISPOSITIVO
Ante o exposto, com base no art. 269, I do CPC, julgo parcialmente procedente a lide reconhecendo a atribuição do IBAMA para a expedição das licenças ambientais e determinando:
A anulação das licenças concedidas pela FEEMA/INEA e que ainda não tenham sido exauridas, conforme fundamentação supra;
Que ao analisar o requerimento de licenças ambientais a ser realizado pela PETROBRAS, o IBAMA observe o disposto na Lei do Estado do Rio de Janeiro nº 3.111/98, devendo ser observado o impacto ambiental sinérgico dos elementos que compõem o complexo do COMPERJ, bem como evitado o fracionamento do licenciamento ambiental em seu aspecto ideológico, conforme fundamentação supra.
Em vista do reconhecimento da incompetência da FEEMA/INEA para o licenciamento ambiental, bem como em vista da difícil recuperação do meio ambiente e para se evitar efeitos danosos às reservas ambientais que estão na área de influencia do COMPERJ, como, por exemplo, aqueles oriundos de chuvas ácida, antecipo os efeitos da tutela determinando a imediata paralisação de todas as obras de construção do COMPERJ relacionadas na fundamentação supra até que seja concedida nova licença ambiental, dessa vez pelo IBAMA.
Para se evitar maiores prejuízo ambientais determinando ainda que apesar da Paralisação das Obras, deverá a PETROBRAS continuar atuando no sentido de cumprir as condicionantes fixadas pela FEEMA/INEA até que novas condicionantes sejam fixadas pelo IBAMA.
Desde já, fixo multa no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por dia de descumprimento da paralisação aqui determinada, ficando desde já o valor dela oriundo destinado ao Fundo Carteira Ambiental que é administrado pelo MPF devendo ser aplicado nas APAs localizadas na área de influência direta e indireta do COMPERJ.
Elucido, por fim, que cabe às partes IBAMA e Petrobrás o inicio, na seara administrativa, do procedimento da concessão de novas licenças ambientais em substituição daquelas que foram aqui anuladas.
Deixo de condenar os requeridos no pagamento das custas processuais finais e honorários advocatícios em vista da ausência de má-fé e da necessidade de aplicação isonômica do art. 18 da Lei nº 7.347/85.
Notifique-se o relator do Agravo de Instrumento noticiado às fls. 330/368 do teor da presente sentença.

P.R.I.
Itaboraí, 08 de maio de 2013.

3 comentários:

  1. É a bandalha que se faz com as leis ambientais. Temos uma das mais lindas leis do planeta, que servem para serem rasgadas de acordo com os interesses maiores. É escandaloso. E esse duto no litoral de Itaipuaçú também é um absurdo, pois além de tudo, trata-se de uma costa super instável, sujeita a ressacas indescritíveis.

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    1. Você tem razão, Lara!
      Por muitas vezes nossa belíssima legislação serve apenas para enfeitar as aulas de direito ambiental.
      Porém, penso que devemos fortalecer iniciativas como desse juiz federal, mesmo que a sentença não atenda a todos as expectativas que tenhamos sobre a matéria. É, pelo menos, um bom começo!

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  2. rogério.. muito bom seu blog.. estou estudando licenciamento, e estou aqui pesquisando.. mas não vou conseguir terminar de ler, apesar de interessantissimo.. não aqui.. pq esse verde de fundo dificulta muito a leitura.. cansa.. força..
    De qualquer forma te agradeço e me desculpa o palpite, achei que um feedback de quem está interessado, poderia ser legal.
    um abraço!
    annelise

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