Carta de Santos
Os professores de Direito Ambiental, integrantes da APRODAB –
Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil, reunidos na cidade
de Santos/SP, nos dias 26 e 27 de novembro de 2015, por ocasião do 13º
Congresso Brasileiro do Magistério Superior de Direito Ambiental, vimos a
público apresentar a seguinte manifestação:
I – Retrocesso legislativo, interpretação sistemática da legislação
florestal e importância da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
I.1. É absolutamente lamentável a falta de compromisso do
Poder Legislativo brasileiro em relação ao respeito dos princípios
constitucionais do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, posto que têm adotado uma pauta extremamente retrógrada no
Congresso Nacional, com projetos que dificultam a criação de novas unidades de
conservação da natureza, reduzem a proteção das unidades já existentes,
facilitam o incremento da atividade minerária nesses espaços territoriais
especialmente protegidos, flexibilizam o licenciamento ambiental em benefício
de empreendimentos causadores de significativo impacto, ameaçam os direitos dos
povos indígenas e dos descendentes de quilombolas.
I. 2. No mesmo sentido, não é possível aceitar o retrocesso na
legislação florestal aprovado em 2012 e o continuado enfraquecimento dos órgãos
ambientais, tradicionalmente às voltas com escassez de recursos, má remuneração
de pessoal e direção pouco disposta a enfrentar interesses econômicos poderosos
e pouco afeitos à observância de políticas empresariais ambientalmente
sustentáveis.
I.3. Existe um microssistema da legislação florestal formado
pelo Código Florestal, Lei de Proteção da Mata Atlântica, Lei de Crimes
Ambientais, Lei das Unidades de Conservação, Lei da Biodiversidade, Lei de
Concessão Florestal, Lei de Gerenciamento Costeiro, Código Civil Brasileiro, e
que gravitam em torno dos ditames axiológicos da Política Nacional do Meio
Ambiente e da Constituição Federal no que concerne à proteção do meio ambiente.
I.4. Diante do quadro institucional apresentado, merece
encômios o Superior Tribunal de Justiça, pelo exercício de um papel decisivo no
reconhecimento e fortalecimento dos direitos ambientais e que a jurisprudência
ambiental constitui direito adquirido coletivo, impedindo retrocessos que
tragam situações de desequilíbrio jurídico, insegurança e quebra da isonomia.
II – Desastre ambiental em Mariana
II.1. O desastre ambiental provocado pelo rompimento de depósito de
rejeitos de mineração no município de Mariana revela com precisão a gravidade
do caos e desleixo da Administração Pública e de abastados setores empresariais
na adoção dos princípios da prevenção e da precaução em relação à proteção do
ambiente.
II.2. É absurda e indigna a forma como se lida com a proteção
do meio ambiente e a vida das pessoas, especialmente as menos favorecidas, na
medida em que o desastre poderia ter sido evitado caso houvesse o cumprimento
mínimo de medidas de precaução e prevenção.
II.3. A falta de um plano de emergência contra acidentes
revela o descaso para com as vidas humanas que foram ceifadas, bem como toda a
fauna e flora do Rio Doce que foi extinta, que é fruto da irresponsabilidade
conjunta do Estado e do empresariado, não se podendo admitir que seja
transferida para a população local o ônus de arcar com parte dos prejuízos
sofridos em razão do desastre artificialmente provocado pela exploração
predatória dos recursos minerais do Estado de Minas Gerais por gigantescas
multinacionais do setor.
II.4. É imprescindível que seja prontamente determinado,
judicial ou extrajudicialmente, o pagamento de indenização (dano moral e
material) à população das cidades afetadas, independentemente das severas
sanções penais civis e administrativas pelo prejuízo ambiental causado.
II.5. Devem ser imediatamente revisadas todas as licenças
referentes às barragens das empresas de mineração em funcionamento no Brasil,
determinando a apresentação de planos de emergência e estudos que atestem a
suportabilidade dos rejeitos.
III – Incêndio em Chapada Diamantina
III.1. É chocante a incapacidade da Administração Pública em
prevenir a ocorrência de incêndios em parques nacionais.
III.2. A destruição do Parque Nacional de Chapada Diamantina
causa profunda consternação e indignação pela falta absoluta de oferecimento de
meios materiais e de pessoal especializado para o controle de incêndio que já
destruiu significativamente sua fauna e sua flora nos últimos dias.
IV – Direito Internacional e Mudanças Climáticas
IV.1. No plano internacional, pugnamos no sentido de que o
país abandone a velha estratégia de esquivar-se de sua responsabilidade comum
pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas, assumindo em Paris uma
atitude proativa e de liderança mundial na defesa do meio ambiente.
V – Responsabilidade por danos ambientais
V.1. Para evitar a dupla vitimização social, a responsabilidade do
Estado pelos danos ambientais, quando presente, submete-se ao regime jurídico
de solidariedade, mas a responsabilidade executiva é subsidiária em relação à execução
primária do poluidor privado.
Santos, 27 de novembro de 2015