quarta-feira, 6 de junho de 2012

Transoeste entra em operação - Prefeitura investe no Transtorno


Começa a operar hoje (quarta-feira, dia 06 de junho) o primeiro corredor expresso de ônibus do Rio de Janeiro – o BRT Transoeste – implantado pela prefeitura com a expectativa de reduzir significativamente as longas viagens de quem freqüenta habitualmente o terminal Alvorada, na Barra da Tijuca, e bairros como Campo Grande, Santa Cruz, Vila Kennedy e Bangu. As mudanças no sistema serão graduais, algumas estações só ficarão prontas em agosto, e ao todo serão 57 estações e terminais. Segundo a previsão da prefeitura mais sete estações serão construídas. Que nota a população dará ao teste?
Um dos pilares de qualquer matriz de desenvolvimento, a questão dos transportes e da mobilidade urbana entra em cena no Rio de Janeiro com a perspectiva de estabelecer planos e sistemas estruturantes para uma política que produzirá reflexos nas próximas décadas. É o caso das vias expressas como a Transoeste, a Transcarioca e a Transolímpica, as duas últimas ainda sem prazo estabelecido para entrar em funcionamento.
Após décadas de estagnação econômica e política, período no qual os investimentos públicos e privados foram sistematicamente esvaziados, o Estado do Rio de Janeiro - desde o início do Governo Sérgio Cabral, em 2007, alinhado ao Presidente Lula - passa por uma transformação que desengavetou diversos projetos de desenvolvimento, abrindo frentes de obras em variadas localidades.
Nesse contexto de prosperidade, o Estado ainda pode contar com alguns incentivos externos, em especial a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, sem esquecer a Rio + 20 – a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que acontece ainda neste mês de junho. Sem dúvida alguma, esses eventos internacionais trarão contribuições inestimáveis para a Cidade do Rio de Janeiro – tanto positivas, quanto negativas.
Como projetos que pretendem produzir mudanças profundas nos sistemas de circulação na Cidade e, portanto, na dinâmica urbana, essas intervenções causam um conjunto de impactos positivos e negativos que – no final das contas – serão vividos pela sociedade. Por isso, é necessário definir o modelo de cidade que se quer, que reflita da melhor forma os desejos, o conforto e os sonhos de todos os seus habitantes.

Será que passam de fato pelo Rodoviarismo as melhorias nos sistemas de transporte e circulação na Cidade do Rio de Janeiro?
Questões como trânsito caótico, longos engarrafamentos, acidentes, transportes públicos lotados e de qualidade duvidosa, dentre outras, fazem da mobilidade urbana um dos principais temas associado aos investimentos que pretendem adequar a infraestrutura da Cidade para os grandes eventos que aqui serão realizados.
Como estamos numa metrópole, não temos como prescindir de políticas públicas estaduais e federais para o trânsito e os transportes. E assim tem sido no Rio de Janeiro. Além dos programas e ações desenvolvidas pela municipalidade, ainda temos as ações promovidas pelo Governo do Estado, sendo que a implementação do Arco Metropolitano é uma das mais visíveis. O projeto pretende instituir uma via expressa que retire o trânsito de cargas das áreas e vias centrais das cidades, desde Itaguaí até São Gonçalo.

A cada ano, 250 mil novos veículos entram em circulação no Rio de Janeiro
É inquestionável a necessidade de aumento das condições de trafegabilidade pela Cidade do Rio de Janeiro. E como somos um dos principais produtores e consumidores de automóveis no mundo, o problema tende a se expandir. E não há como desvincular o aumento dessas demandas por mais espaço das políticas de estímulo à produção e aquisição de automóveis, como a promovida pelo Governo Federal recentemente com a redução do IPI dos carros novos.
O Rio tem uma população atual de mais de 6 milhões de habitantes e uma outra expressiva parcela que trabalha, produz e vive grande parte de sua vida na Capital, mas possui moradia em cidades periféricas. Essas pessoas circulam diariamente com dificuldades entre suas casas e o trabalho, a escola e o lazer. Com a perspectiva de realização dos grandes eventos programados para a Cidade, essa questão tem que ser equacionada. E como a proposta não deveria ser de solução pontual, apenas para o período dos eventos, ela deve atender às necessidades da população atual – com compromisso com as projeções futuras de demanda. Portanto, como serão intervenções de alto custo financeiro e que impactarão a Cidade por várias gerações, esses projetos deveriam estar sintonizados com os princípios, as diretrizes e os instrumentos de planejamento existentes.

Políticas de Transportes são definidas pelos empresários do setor
Um dos maiores problemas enfrentados na elaboração e implantação de políticas públicas para transportes no Rio de Janeiro é que essas políticas são estabelecidas sob o comando dos próprios concessionários, que estão mais preocupados com as suas vantagens nas margens de lucro que a atividade proporciona. Com isso, temos políticas que apostam no sistema rodoviarista, em detrimento de investimentos em transportes sob trilhos ou hidroviários.
Caso do Metrô, cujos tímidos investimentos desde que foi inaugurado, em 1979, nos levaram aos tristes resultados na atualidade. O que era para ser uma alternativa de qualidade, já está bem abaixo das expectativas, dada a limitada capacidade de operar frente às demandas existentes. Apesar da existência dos projetos de expansão das linhas, inclusive a que atravessaria a Baía de Guanabara rumo a Niterói, a construção de novas estações tem acontecido a passos extremamente lentos. E os novos trens importados da China chegam com grande atraso, fora os incríveis problemas de dimensões equivocadas que retardam a sua entrada em funcionamento!
O que dizer, então, dos trens urbanos? Em meados da década de 1980 transportavam mais de 1 milhão de passageiros por dia. Às vésperas de sua privatização, em 1998, operavam com capacidade de 145 mil passageiros/dia, quase dez vezes menos. Hoje, cansamos de assistir estarrecidos na TV a humilhação a que são submetidos os usuários, cerca de 450 mil passageiros/dia, que se deslocam entre o Rio e outras 10 cidades da Região Metropolitana, vítimas de atrasos aviltantes, quebradeiras e violência por parte de quem deveria garantir a ordem.
O transporte hidroviário também é uma importante alternativa para a população da cidade do Rio de Janeiro e de outras cidades da Região Metropolitana, como Duque de Caxias, Magé e São Gonçalo. Porém, o exemplo das linhas já operadas no transporte entre Rio e Niterói não tem sido promissor em qualidade e benefícios, eis que a concessão parece toda desenhada para atender prioritariamente aos interesses do concessionário, deixando a população a ver navios, ou melhor, em barcas à deriva.
Mas há bons projetos para o Município que incluem a ligação Barra–Centro, e Ilha–Botafogo - ligação marítima entre os bairros da Ilha do Governador e Botafogo, com paradas previstas na Ilha do Fundão e no Centro da Cidade, fazendo a ligação entre os aeroportos Tom Jobim e Santos Dumont. O que parece faltar é vontade política no sentido de consolidar tais projetos.
Priorizar o rodoviarismo segue na contramão das melhores alternativas e produz muitos impactos socioambientais por todo o país. Ele retroalimenta a indústria automobilística que impõe novas demandas para a ampliação de vias e rodovias, túneis e viadutos, postos de gasolina e serviços gerais, além de estacionamentos.
O professor do programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ, Fernando McDowell, em matéria publicada na Revista do CREA/RJ, manifestou opinião de que a infraestrutura de transportes da Cidade do Rio ainda está longe de ser a ideal:
“Eu acredito que a solução para a mobilidade está na melhoria do transporte coletivo. Isso pode começar com os três corredores, mas tem que haver melhoria nos trens e metrô, para que atuem de forma integrada. Os ônibus também precisam ser mais eficientes. É preciso criar uma nova filosofia que privilegie o transporte público em detrimento do carro privado. Não como uma obrigação, mas pelo reconhecimento da qualidade dos transportes coletivos. A mobilidade só virá com a garantia de segurança na viagem a pé, com calçadas bem pavimentadas e sinalização horizontal eficiente, além de uma rede cicloviária conectando todos os sistemas de transporte. Com isso, teremos melhorias.”[1]
A frota de veículos no Brasil cresceu mais de 120% nos últimos anos. Saímos de uma frota de 34 milhões para os atuais 70 milhões, apenas entre os anos de 2000 e 2011. O Governo Federal continua estimulando o consumo de veículos e a Prefeitura e o Governo do Rio investem em rodovias, num claro e reprovável fortalecimento do rodoviarismo – que se tornou o grande vilão da qualidade de vida dos cidadãos urbanos.
As crescentes demoras nos deslocamentos acabaram se tornando outro tormento comum na cidade, atuando sobre a subjetividade coletiva de forma extremamente negativa, produzindo doenças de cunho neurológico. Além das emissões de gases variados, resultantes da queima de combustíveis fósseis pelos veículos automotores que também afetam a saúde da população, principalmente os sistemas respiratórios – incidindo diretamente na diminuição da qualidade de vida das pessoas.
Portanto, é notório que há grandes impactos sociais, ambientais e urbanísticos na implementação de projetos viários, como os que estão em processo de elaboração e conclusão no Município do Rio de Janeiro, exemplo da tão propagada Transoeste. Que a  população aposte na correção de rumos por meio de sua avaliação poderosa e sincera. E que ainda tenhamos tempo de reordenar as políticas públicas na direção de uma mobilidade mais justa, eficiente, democrática e sustentável.



[1] Revista do CREA/RJ, Edição nº 82, maio/junho de 2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário