A Fissão Nuclear
Pegue duas placas de ímãs e force a união dos pólos iguais.
Conseguiu juntá-las e mantê-las unidas? Precisou de muita força pra isso? É claro que sim!
Os átomos possuem um núcleo formado por prótons e nêutrons, sendo que os prótons têm a mesma reação que os pólos iguais dos ímãs.
Ou seja, os prótons têm a tendência de se repelirem, porque têm a mesma carga (positiva). Como eles estão juntos no núcleo do átomo, comprova-se a existência de uma energia nos núcleos dos átomos com mais de uma partícula para manter essa estrutura unida.
A energia que mantém os prótons e nêutrons juntos no núcleo é a ENERGIA NUCLEAR, isto é, a energia de ligação dos nucleons (partículas do núcleo). Ela pode ser chamada também de ENERGIA ATÔMICA, porque provém do núcleo dos átomos.
Uma vez constatada a existência da energia nuclear, restava descobrir como utilizá-la.
A forma imaginada para liberar a energia nuclear baseou-se na possibilidade de partir-se ou dividir-se o núcleo de um átomo “pesado”, isto é, com muitos prótons e nêutrons, em dois núcleos menores, através do impacto de um nêutron. A energia que mantinha juntos esses núcleos menores, antes constituindo um só núcleo maior, seria liberada, na maior parte, em forma de calor (energia térmica).
Essa é a lógica da produção da energia nuclear ou atômica.
Um programa oficial e um paralelo
Na década de 30, surgiram as primeiras pesquisas na área nuclear no Brasil. Entretanto, somente a partir de 1945, com a explosão das bombas em Hiroshima e Nagasaky, o governo brasileiro passa a demonstrar interesse em tal setor. Desde então, em meio a controvérsias quanto ao uso da energia nuclear para fins bélicos, a busca sistemática pelo domínio da tecnologia nuclear, direcionada a uma hegemonia brasileira na América Latina, marcou as décadas seguintes da história da política nuclear brasileira.
A importância estratégica da tecnologia nuclear é logo observada pelos militares, tendo como principal protagonista o almirante Álvaro Alberto da Mota e Silva. As propostas levantadas pelo almirante foram englobadas pelo Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), fundado em 1951 e tendo o mesmo como primeiro presidente.
Em 1953, Álvaro Alberto acerta secretamente com a Alemanha a construção de três ultracentrífugas, utilizando tecnologia desenvolvida pelos nazistas, que seriam enviadas ao Brasil para o desenvolvimento da tecnologia de enriquecimento de urânio. Antes de serem remetidas ao Brasil, devido ao vazamento de informações, as ultracentrífugas são apreendidas pelos Estados Unidos.
A escolha de Mambucaba – Angra dos Reis
Entre 1959 e o governo Jânio Quadros, surgem planos para a instalação de um reator nuclear em Mambucaba (sul do estado do Rio de Janeiro), cuja maior parcela da tecnologia aplicada seria nacional, já visando o desenvolvimento de uma indústria nuclear brasileira. O dilema era qual combustível utilizar: o urânio natural ou o enriquecido.
No âmbito normativo, o histórico aponta em 1951 a edição do Decreto n° 30.230/51, que aprova o Regulamento para Pesquisa e Lavra de Minerais de interesse para a produção de Energia Atômica. Cinco anos depois, é a vez do Decreto n° 40.110/56 – que cria a Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN. E, na sequência, vem o Decreto n° 47.574/59 – que cria, na CNEN, a Superintendência do Projeto Mambucaba.
A militarização completa do Programa Nuclear
Com o golpe de 1964, ocorreu uma militarização do país, atingindo todos os setores da política e da economia. Consequentemente, as atividades no campo nuclear foram completamente dominadas pelos militares.
Em 1968, a CNEN assina um convênio com a Eletrobrás, por meio do qual caberia a Furnas (subsidiária da Eletrobrás) a construção de uma usina nuclear em Angra dos Reis. Delineava-se a compra de um reator norte-americano de urânio enriquecido, em contraposição às antigas idéias nacionalistas de obtenção da tecnologia nuclear nacional. Vários cientistas, dentre eles o físico José Leite Lopes, manifestaram-se contrários, mas, em 1968, com o Ato Institucional n° 5 (AI-5), os mais variados meios de repressão sufocaram tais manifestações.
Em 1971, concretizou-se a compra de um reator de água pressurizada (PWR) fabricado pela Westinghouse. O contrato de compra representava uma simples aquisição de equipamento, sem nenhuma transferência de tecnologia.
É nesse período que ocorre a desapropriação da área de Mambucaba para instalação de uma Central Nuclear de Energia Elétrica (Furnas S/A) que, em seguida, ganha a denominação de “Almirante Álvaro Alberto”, por meio da Lei 5.942/73.
Os esforços de estruturação de corporações para o desenvolvimento e execução da energia nuclear avançam. E são criadas subsidiárias da Nuclebras (1975):
NUCLAN – Nuclebras Auxiliar de Mineração S/A
NUCLEN – Nuclebras Engenharia S/A
NUCLEI – Nuclebras Enriquecimento Isotópico S/A
NUCLEP – Nuclebras Equipamentos Pesados S/A
NUCON – Nuclebras Construtora de Centrais Nucleares S/A (1980)
NUCLEMON – Nuclebras de Monazita e Associados S/A (1983)
A Usina ANGRA I
A usina conhecida como Angra I acumulou uma longa história de incidentes e erros de projetos. Sua localização, nas proximidades da cidade de Angra dos Reis, é considerada por alguns pesquisadores, inadequada. A falta de um sistema de transporte eficiente para a retirada dos moradores em caso de acidente compromete a segurança. As condições estruturais do terreno são as piores, devido a uma falha geológica na região denominada de Itaorna, batizada pelos índios com o significado de Pedra Podre.
Na primeira metade da década de 70, o país vivia o chamado milagre brasileiro, no qual militares e tecnocratas esperavam transformar o Brasil em uma potência industrial e militar. As expectativas eram de falta de energia gerada pelas hidrelétricas, e como o carvão e o petróleo traziam dependência de importações, a única saída era a energia nuclear.
A opção mais vantajosa era os reatores de urânio enriquecido, pois tem maior rendimento que o urânio natural, mas a tecnologia de enriquecimento era desconhecida no Brasil.
No Acordo Brasil-Alemanha, as vantagens para os alemães eram mais claras do que para os brasileiros. Com o acordo, as empresas alemãs buscavam novos mercados para o setor nuclear pois, internamente, o programa nuclear alemão enfrentava uma grande oposição de grupos ecologistas. Além disso, havia grande interesse alemão nas reservas de urânio no Brasil.
Mas contradições surgiram, por exemplo, no orçamento do projeto nuclear brasileiro. O custo inicial da construção de 8 usinas nucleares era de U$ 10 bilhões, o qual mais tarde atingiu os U$ 36 bilhões. Além disso, o custo por kW da energia nuclear seria de U$ 400.00, que mais tarde passou a U$ 3000.00, enquanto que o da energia hidrelétrica, na época, era de U$ 300.00. Erros ou aparentes disfarces como esses, revelaram a pressa que os militares tinham em adquirir a tecnologia nuclear.
A primeira manifestação contrária ao acordo foi divulgada no início de 1978, pela Sociedade Brasileira de Física (SBF), questionando o procedimento autoritário e obscuro do governo brasileiro.
O acordo era totalmente desfavorável para o Brasil, pois o país se tornaria dependente da Alemanha na produção e utilização de equipamentos, por um tempo não determinado.
A estratégia nuclear brasileira teve repercussão mundial. A preocupação internacional era devido à recuperação do urânio enriquecido utilizado nas usinas, pois o material residual, o plutônio, é a matéria-prima para a fabricação de bombas nucleares.
Em 1979, devido à desmoralização do Programa Nuclear Brasileiro, deu-se início ao Programa Nuclear Paralelo, patrocinado pela Marinha, Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares.
O programa paralelo tem sua raiz em um projeto eminentemente militar. Em meados dos anos 70, durante o chamado milagre brasileiro, o regime militar procurou levar adiante o projeto Brasil Potência, injetando recursos no desenvolvimento de áreas consideradas estratégicas como: indústria bélica, aeronáutica, informática, programa espacial, telecomunicações e o programa nuclear. Deste modo, excluiu recursos nas áreas de necessidades básicas da população. Devido a problemas com a técnica de jato-centrifugação para o enriquecimento de urânio, e com a fiscalização internacional contra a proliferação de armas nucleares, o programa paralelo enfrentou uma fase de pouco desenvolvimento.
Ao mesmo tempo, a Argentina crescia rapidamente no setor nuclear. Temendo a perda da supremacia nuclear na América do Sul, os militares criaram um projeto paralelo totalmente clandestino, sem fiscalização nacional e internacional, desenvolvendo a técnica de ultracentrifugação para o enriquecimento de urânio.
Em 1979, Rex Nazaré Alves assume a presidência da CNEN, e, junto ao IPEN, completou o grupo de coordenação do programa paralelo: o presidente João Figueiredo; Serviço Nacional de Informações (SNI), Otávio de Medeiros; Conselho de Segurança Nacional (CSN), Coronel Araripe; Ministério da Marinha, Maximiliano da Fonseca; CNEN, Rex Nazaré; IPEN, Ivo Jordan; e Coordenadoria de Projetos especiais da Marinha (Copesp), Othon Pinheiro – atual presidente da Eletronuclear.
Década de 80 – Estações Ecológicas e os maiores acidentes no mundo
No ano de 1980, o Governo Militar edita um decreto curioso: determina que sejam criadas Estações Ecológicas no entorno de usinas nucleares que, à época, eram programadas para serem localizadas em áreas paradisíacas, contraditoriamente com grande potencial para o desenvolvimento do turismo ecológico. Além de Angra dos Reis/RJ e Iperó/SP, ainda havia planos para a instalação de outras usinas no litoral paulista, na região onde hoje se localiza a Reserva Biológica da Juréia.
Esta previsão consta do Decreto n° 84.973/80 – que dispõe sobre a colonização de Estações Ecológicas e Usinas Nucleares. Em 1986 é editado o Decreto n° 92.754/86 – que institui Grupo de Trabalho para implementação de Estação Ecológica na área da CNAAA.
No mesmo ano ocorre o maior acidente nuclear da história, na Usina de Chernobil, localizada na Ucrânia. E no ano seguinte, o segundo maior, no Brasil: o acidente nuclear de Goiânia. Em razão deste acidente, foi editada a Lei n° 9.425/96 – que instituiu Pensão Especial às vítimas do acidente: são cinco categorias de pensão vitalícia, definidas de acordo com as limitações que a contaminação causou a cada pessoa, inclusive aos profissionais da vigilância sanitária que foram expostos à radiação. A pensão é definida como personalíssima, não valendo para sucessores no caso de óbito de algum beneficiário.
À época, tentava-se mostrar uma aparente transparência na política nuclear brasileira, divulgando fins pacíficos para a energia nuclear, o que não significou menor concentração de poderes na mão dos militares. Neste processo, a CNEN obteve amplos poderes sobre todas as atividades do Programa Nuclear Brasileiro, assumindo uma posição perigosa, pois era encarregada de desenvolver atividades nucleares e, ao mesmo tempo, de fiscalizá-las.
O CTA – Centro Tecnológico de Aeronáutica priorizou o seu envolvimento nos trabalhos de enriquecimento isotópico por laser. A Aeronáutica, por sua vez, construiu a partir de 1981, na Serra do Cachimbo - PA, covas e cisternas de até 320 metros de profundidade, com 1 a 3 metros de largura, para testes nucleares e depósito de rejeitos radioativos, no chamado "Projeto Solimões".
Novamente é levantado o problema da escassez de energia na região sudeste. Este argumento é utilizado desde a década de 60 para justificar a proliferação da energia nuclear.
A publicidade do Programa Paralelo
Em 1986, boatos sobre instalações de pesquisas da Marinha, ligadas ao setor nuclear, levaram o vereador de Sorocaba, Osvaldo Noce, a pedir esclarecimentos à mesma, que divulgou todo o seu posicionamento sobre o submarino nuclear brasileiro, pedindo total sigilo sobre tais informações. Entretanto, os vereadores ignoraram tal pedido de sigilo, e divulgaram à população as atividades secretas do complexo de Aramar, em Iperó/SP.
A revolta da população tomou conta de Sorocaba, e foi agravada pelo fato de o local escolhido para as pesquisas ter sido a Fazenda Ipanema, patrimônio histórico da região, com potencial para ser utilizada em pesquisas agronômicas e como pólo turístico. A Fazenda Ipanema, onde estão localizadas as estruturas da primeira fundição no Brasil – onde foram produzidas as armas para a Guerra do Paraguai, tornou-se uma Unidade de Conservação Federal – a Floresta Nacional – FLONA IPANEMA, administrada atualmente pelo ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente.
A situação tornou-se ainda mais crítica com o acidente de Goiânia (com materiais médicos que continham o Césio 137), mostrando a ineficiência da fiscalização prestada pela CNEN. Preocupado com a rival Argentina, o presidente José Sarney, em 1987, divulgou em rede nacional que cientistas brasileiros haviam conseguido dominar a tecnologia de enriquecimento de urânio por ultracentrifugação e, através do Decreto-lei 2.464, de 31 de agosto de 1988, os projetos clandestinos são oficializados e trazidos ao conhecimento da sociedade brasileira. De acordo com o decreto, estava determinado também, a conclusão da construção das usinas de Angra II e III (com uma reavaliação do acordo com a Alemanha), e a construção de um reator em Iperó/SP para servir de protótipo para os reatores do submarino nuclear.
Em 1989, o almirante Othon Pinheiro da Silva, diretor do Centro Experimental de Aramar, em Iperó/SP, previa o início da produção de urânio enriquecido a 20%, "em escala comercial", a partir de 1990, na "Unidade de Enriquecimento Isotópico Almirante Álvaro Alberto".
Os altos custos
O programa da Marinha havia gasto, até então, cerca de US$ 670 milhões e precisaria da mesma quantia para, em oito anos, concluir o reator que serviria ao submarino.
Uma manifestação visível da campanha foi a visita de jornalistas às instalações do CTMSP (Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo), na Cidade Universitária, e no Centro Experimental de Aramar. No dia 2 de fevereiro de 1996, o ministro almirante Mauro Pereira anunciou que a Marinha tinha suspenso o projeto de codinome "Chalana", da construção de um submarino com propulsão nuclear, após 17 anos de trabalho no Complexo de Aramar e no Centro Tecnológico da Marinha, na USP.
Reportagens alarmantes publicadas em 1997 revelam que o Exército tentou reiniciar a construção de um reator experimental de plutônio em Barra de Guaratiba - RJ, conhecido como Projeto Atlântico, demonstrando a autonomia dos militares neste assunto.
Com o início da operação do reator de Angra II, em 21 de julho de 2000, a energia nuclear passa de 0,9% a 2,1% da matriz energética brasileira. Se a operação de Angra III for efetivada, o percentual da energia nuclear estará acima dos 5%.
A questão do destino do lixo radioativo de Angra I e II ainda não está definida. Provisoriamente, este ficará estocado próximo às usinas. Um dos dejetos mais perigosos é o plutônio, que tem meia-vida de 24 mil anos, além dos materiais contaminados de menor atividade.
Devido à falta de financiamento e ao excesso de endividamento, Angra II extrapolou os cronogramas e orçamentos iniciais. Suas obras tiveram início em 1975 e foram concluídas 25 anos depois, em 2000, um tempo enorme quando comparado aos de usinas nucleares no mundo, da ordem de 5 anos. O orçamento de Angra II atingiu US$ 10 bilhões, enquanto Angra I custou US$ 2,5 bilhões.
As fontes
Informações obtidas através das seguintes fontes:
1- Site da CNEN – www.cnen.gov.br;
2- Roteiro para aula da disciplina “A Questão Nuclear”, na Pós-Graduação em Direito Ambiental da PUC/RJ, ano 2009, Prof. Rogério Rocco;
3- Artigo “Uma breve História da Política Nuclear Brasileira”, de Renato Yoichi Ribeiro Kuramoto e Carlos Roberto Appoloni (Departamento de Física UEL – Londrina/PR) http://www.fsc.ufsc.br/cbef/port/19-3/artpdf/a6.pdf
bom resumo!!
ResponderExcluirPrrezado Rogério, de fato uma recapitulação como a sua nos faz criar enfoques sob pontos de vista da dialética e do fato processual. dDepois comento. Um abraço! Denise Velasco.
ResponderExcluirObrigado, Flávia e Denise!
ResponderExcluirEstou preparando mais. Mas se puderem ajudar na divulgação, melhor ainda.
Um beijo, quer dizer, dois...