sábado, 12 de maio de 2018

Um modesto tributo pela partida do jovem Ronaldo Coutinho!

A precoce desencarnação de um verdadeiro mestre e amigo, um dos últimos legítimos comunistas, dos maiores humanistas e eterno crítico acadêmico e político


Ronaldo é uma das poucas pessoas que conheci que conseguiu manter-se jovem por mais tempo na vida. Seus cabelos e barba brancos não corrompiam sua juventude, marcada pela vivacidade de seu humanismo, de sua indignação diante das injustiças, do vigor de sua crítica à crueldade do capitalismo, de sua integridade intelectual, de sua maturidade acadêmica.

Por esse eterno espírito juvenil, por sua permanente militância política, Ronaldo foi perseguido pelos adoradores do status quo, aqueles apegados aos podres poderes, às ideias vazias, às lacunas ideológicas e ao pragmatismo conservador. Mas Ronaldo era resistente, era forte e, acima de tudo, era um semeador. Espalhou sementes por onde passava, sementes que floresceram, que geraram árvores e formaram florestas com farta diversidade!

Mas nessa madrugada, Ronaldo desencarnou. Deixou-nos da vida terrena e partiu para o mundo espiritual. Foi uma partida precoce, da qual lamentamos. Ronaldo ainda tinha missões a cumprir. Sua juventude ainda lhe cobrava muitos planos pela frente.

Na semana passada, quando postei um dos meus sonhos psicodélicos no Facebook, alguém me perguntava sobre meu doutorado, ao que respondi que estava me enlouquecendo. Ronaldo comentou que eu não precisava de doutorado para enlouquecer... É verdade, concordei. Ronaldo me conhecia bem. Sabe que destoo do caráter de normalidade que impregna a subjetividade contemporânea. E por isso gostava de mim. E por ele ser outro 'louco', eu o amava também!

Sinto muito por sua partida. Sinto pela dor da família, pela dor dos amigos, dos alunos... Ele estava nos nossos planos futuros e nós nos dele também.

Meu amigo Ronaldo me ligou na semana passada para pedir que eu reservasse o dia 26 de maio. Falou que faria 80 anos no dia 28, mas como cairá numa segunda, comemoraria no dia 26. Disse que faria como em seus 70 anos e que a festa seria muito do meu gosto, com bebidas e música à vontade, com DJ, pista de dança, tudo de graça. Que o único ônus dos convidados seria ouvir o discurso do aniversariante! Estava feliz, muito feliz em comemorar.

Não sem um tom de incômodo, comentou que estava lutando contra o câncer. Mas assegurou: Eu o venci! Mas que ainda tinha exames a fazer, talvez pelas consequências da radioterapia. Lamentou a perda da filha pela mesma doença há exatamente um ano, mas se mostrou guerreiro, disputando a vida a cada segundo. Celebrando-a a cada motivo!

                                                         No lançamento da primeira edição do nosso livro O Direito Ambiental das Cidades, em 2004

Perguntou-me do doutorado, ao que lhe respondi que estava de fato muito tenso, atrasado, mas produzindo. Ele, então, pediu que eu fosse a sua casa na sexta-feira (ontem), que ele me ajudaria nessa reta final. Fiquei muito feliz pelo acolhimento do meu mestre. Ronaldo foi meu orientador no mestrado em Direito da Cidade, na UERJ. Foi minha inspiração no trabalho que fiz sobre o Estudo de Impacto de Vizinhança - EIV, que virou livro em 2006. Mas antes mesmo da conclusão do mestrado, fizemos uma parceria na coordenação do livro O Direito Ambiental das Cidades, uma coletânea que chegou a sua segunda edição em 2009. Com a edição esgotada, tínhamos combinado de preparar a terceira edição logo depois da conclusão do meu doutorado, revista e ampliada. Aventei também meu desejo que ele estivesse na minha banca de doutorado. E ele estará, como principal homenageado!

Ronaldo comentou que em razão da doença, tinha parado por um tempo de escrever. Mas que estava retornando à produção. E que, a partir de agora, só escreveria sobre o direito ambiental. Seu projeto em curso era um novo livro sobre o tema. Disse que não ia aproveitar praticamente nada do que tinha produzido em artigos. Seria uma produção inteiramente nova, em capítulos, na qual trataria das questões filosóficas e políticas: será o direito ambiental um direito simbólico? Disse que responderia a essa questão... e que já teria umas cinquenta e poucas páginas escritas. Falou da Samarco, dos grandes projetos e suas consequências, da legislação ambiental e urbanística comparadas, do que não consta mais da legislação e continua sendo aplicado.

Mas o seu projeto foi interrompido precocemente! 

Amanhã será seu velório e sua cremação (13/05 - Capela da Penitência, Caju, entre 9hs e 16hs). Amigos e familiares se reunirão para a despedida, para a homenagem merecida a uma vida dedicada a plantar esperança, para a solidariedade à sua companheira Maria Tereza de Menezes e aos seus familiares.

Mas o Mestre Ronaldo que nos habita, que contagiou nossos corações e mentes, permanecerá vivo, jovem, forte e lutador. O adubo que ele nos ofereceu floreou nossas vidas e penso que temos o compromisso de complementar a nova obra do Ronaldo. Somos muitos Ronaldos: a Danielle Moreira - de quem ele tanto se orgulhava, a Tatiana Cotta, o Luigi Bonizatto, o Flávio Ahmed, o Celso Fiorillo, o Wilson Madeira, o Fernando Walcacer, a Ana Motta e uma enorme legião de pessoas que foram iluminadas por sua Luz!

Ronaldo do Livramento Coutinho! Amigo, Mestre, Comunista verdadeiro, Libertário, Rubro-Negro!

Ronaldo Presente! Sempre!

Meu fraterno e carinhoso abraço!!!